domingo, 1 de abril de 2018

Depois de tanto tempo, um novo rumo



          Inicialmente, o objetivo deste blog foi desenvolver minha capacidade de escrita e utilizar um processo lúdico para construção de histórias nos idos tempos de ensino fundamental. Hoje este objetivo passa a ser diferente: compartilhar aprendizados. 
          Para tanto, precisamos relembrar alguns conceitos. Todos nós somos poeira de estrelas (Carl Sagan)... somos parte de incontáveis processos físicos e químicos que nos originaram e nos permitiram estar aqui hoje, celebrando a vida e, em especial, a oportunidade de estarmos vivos. Nesse sentido, como a imagem acima ilustra, é sempre libertador lançarmos um olhar diferente, sob diferentes perspectivas sobre os fatos e, desse modo, aprimorarmos nossa compreensão de tudo o que nos cerca.  
       Por ser uma ferramenta não científica, ressalto ao querido leitor que examine os textos compartilhados à luz da razão e do bom senso, a fim de julgar se o referido escrito trata-se de algo útil ou não. Uma excelente leitura! 


      "Às vezes, precisamos ver as pessoas como frutos. Se olhares para qualquer árvore, verás que podem haver vários frutos. Alguns amadurecem antes de outros, então na mesma árvore, em determinado momento, temos frutos maduros e verdes. Não podemos exigir que um fruto verde exerça as mesmas funções e tenha o  mesmo efeito de um fruto maduro. Poderemos gritar, brigar, espraguejar... ainda assim o fruto verde continuará verde, sem todo o potencial que um fruto maduro possui. Ele simplesmente não tem a capacidade de ser maduro. 
Em compensação, há outros frutos que estão maduros. Tão maduros que caem ao chão. O impacto é dolorido, mas o fruto não está mais conectado à arvore e, de certa forma está pronto para tudo que o futuro reservou para ele. Entretanto, ele caiu sob a sombra da árvore e não consegue ter a visão de todo o horizonte que o céu possui, pois a árvore obstrui o campo de visão do fruto. 
Através da grande sabedoria e bondade de Deus, Ele permite com que um pássaro venha se alimentar do fruto. Quando ele começa a bicar o fruto, é mais dolorido que o tombo, expõe todas as suas entranhas, deixa-o completamente vulnerável. Porém é esse mesmo processo que permite com que a semente seja exposta e, após, transportada pelo pássaro para um outro lugar... onde essa semente é lançada à terra e germina, gerando uma linda e frondosa árvore que, por sua vez, produzirá inúmeros frutos por si mesma.
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Explicando essa metáfora, os frutos somos nós e a árvore os nossos genitores. Quando estamos prontos para iniciarmos nossa vida madura (adulta) sofremos com o impacto dos primeiros conflitos familiares e isso nos machuca. Claramente há uma divergência de ideias e as discussões parecem ser inevitáveis. Os pais dizem que é coisa da "aborrescência" enquanto os filhos passam a nutrir sentimentos de raiva e se sentem injustiçados por terem sua liberdade negada. 
O pássaro, por sua vez, são as adversidades, os problemas que a vida nos traz. Eles fazem com que nos reviremos de dentro para fora nos expondo e nos deixando vulneráveis. Todo o nosso conteúdo interior fica visível a quem quiser ver. Ficamos nus. Entretanto, esses mesmos problemas são os que permitem com que nossa essência seja liberta, e assim, transportando-nos para novos horizontes. São os problemas da vida que nos trazem a tão sonhada liberdade e também são eles que revelam a nossa verdadeira identidade, pois o que somos é a nossa semente, é a nossa essência. São os problemas que nos transportam para uma nova vida e uma nova missão no mundo: crescer e gerar novos frutos. E não necessariamente esses frutos são a prole... Eles podem ser traduzidos como um novo emprego, um(a) companheiro(a), ou até mesmo uma mudança radical de estilo de vida."

                                                                                              V. R. C.







sexta-feira, 15 de março de 2013

#18 O elemento surpresa


     "A semana toda já passou e nada do tal do presente que ele me prometeu, estou quase começando a acreditar que tudo não passou de um engano..." pensava Clarice, sentada na mesma mesa da biblioteca do mosteiro, onde estivera sentada há exatamente uma semana. E esse pensamento foi como o pino de uma granada, que desencadeou um fato surreal: enquanto ela estava terminando de pensar, mesmo não havendo nenhum vento, seus livros começaram a se folhear e o lápis que há pouco segurava elevou-se no ar e apontou uma estante, logo depois baixando e se pondo novamente sobre a mesa, sempre apontando na mesma direção.
     O coração de Clarice disparou como uma flecha e seus batimentos estavam descompassados, parecia que seu funcionamento interno havia se alterado por completo, estava quase sem ar. Levantou-se lentamente e começou a andar na direção apontada, tentando achar algo que chamasse a atenção no meio de tanto livro velho e pó juntos. Um leve tremor tomou conta de seu corpo quando uma pequena caixa, da parte mais alta da velha estante, caiu de uma forma tão graciosa e se pôs aos seus pés. Estava decorada de maneira simples, mas de um requinte excepcional; havia uma fita vermelha com bordas douradas ao seu redor e um bilhete em papel de seda com a frase:

 "O homem está pronto para tudo desde que lhe seja dito com mistério; quem quer ser acreditado deve falar baixo." Chazal, Malcolm.

     Curiosa como era, Clarice, com muito cuidado, abriu o embrulho e para sua surpresa havia uma única trufa, exatamente no centro. Na parede posterior interna da caixa estava escrito, em verso: "Para o problema solucionar/ apenas uma mordida deve-se dar/ o batimento volta ao normal/ tudo volta a ser natural."
     Não teve dúvidas. Não hesitou. Comeu. E o sabor daquele confeito era como mel em sua língua, mas à medida que alcançava seu estômago se tornava amargo como fel. Mas a sensação era ótima, maravilhosa. Aos poucos, começou a se sentir tão leve, parece que todo seu seu corpo, sua alma, eram diferentes.



#Continua.
   

sábado, 22 de setembro de 2012

#17 Incógnitas reveladas



     Passaram-se alguns dias e Clarice ainda estava encucada com aquele sonho maluco que teve, aquelas palavras esquisitas... nada fazia muito sentido ultimamente. Seus afazeres escolares tinham ocupado uma boa parte de seu tempo, embora sua mente estivesse em outro mundo. Certamente seu rendimento não foi dos melhores, então decidiu ir estudar na biblioteca do mosteiro, que ficava próximo de sua casa. Pegou O Livro, misturado em meio aos seus livros didáticos e se foi.
     Chegando lá, para sua surpresa, a biblioteca estava completamente vazia, excetuando-se o frei que estava sempre por ali, limpando uma prateleira aqui e acolá. Esparramou suas muambas por cima da mesa e se sentou. Estudou um pouco de matemática, se cansou. Uma leve brisa entrava pela janela aberta, ao seu lado, e permitiu que a mente dela voasse... "Aquelas palavras, o que significam? A quem se referem? Que coisa mais louca..."
     Do nada um vento mais forte fez com que O Livro fosse aberto. Clarice, despertada de sua viagem mental, passou a ler o que estava escrito naquela passagem:

"Então da parte da Divindade Soberana foi enviada aquela mão, que escreveu este escrito.
Este, pois, é o escrito que se escreveu: MENE, MENE, TEQUEL, PARSIM."

     Clarice, num tremor instantâneo, lembrou "o meu sonho" e prosseguiu:

"Esta é a interpretação daquilo: MENE: Contado foi o teu reino, e o acabou.
TEQUEL: Pesado foste na balança, e foste achado em falta.
PARSIM: Dividido foi o teu reino, e dado aos medos e aos persas.
Naquela noite foi morto Belsazar, rei dos caldeus.
E Dario, o medo, ocupou o reino, sendo da idade de sessenta e dois anos." 

    Ela nunca havia lido aquele trecho do livro, e que loucura! Tratava-se de uma história que realmente aconteceu! Como ela poderia ter sonhado com aquilo?
     Pensou em perguntar algo para Emanuel, sim, ele! Fazia alguns dias que não falava com o seu protetor, e o sonho que tivera só podia ser coisa dele. Mas por quê? Aquilo não tinha nada a ver com sua vida, era algo meio avulso em meio a tanta coisa. Ali mesmo, naquela velha biblioteca, concentrou-se e, olhos fechados, invocou-o em pensamento.
     Alguns segundos se passaram e, para seu espanto, achava-se ali, sentado bem a sua frente, o velhinho mais sábio que já conhecera. Incrível.
     Conversaram por horas, e Clarice, perguntando tudo que podia numa avidez sem limites, de súbito parou. Um silêncio momentâneo pairou e Emanuel lhe disse:
-Sabe filha, tem coisas que só descobrimos com o passar do tempo. E eu sei o tempo certo para todas as coisas que acontecem contigo... conhecer a Alden foi crucial pra ti, neste momento. Ela é uma pessoa rica em conhecimento, o qual tu precisas. E mais: nenhuma ameaça da Charna vai se realizar, todos eles juntos não têm o poder que eu tenho no dedo mínimo do pé. Não se preocupe.
-Mas eles disseram que vão matar todos ao meu redor e me deixar por último...
-Não se preocupe.
-Às vezes parece que você está tão longe de mim, parece que eu estou vulnerável... o que faço nessas horas?
-Basta que tu feche os teus olhos e se concentre em mim. Direta ou indiretamente farei tudo cooperar para o teu bem, sempre.
-Está bem, eu acredito, mesmo sem ver.
   
     Numa exclamação empolgadíssima Emanuel saltou da cadeira e gesticulava e falava ao mesmo tempo:
-É isso!!! Acreditar sem ver. Tu precisas acreditar em mim, mesmo sem me ver. É isso que me agrada. Porque é muito fácil acreditar quando se vê, disso todo mundo é capaz... mas crer sem ver é para poucos! É o dom que me satisfaz!!! E por essa tua atitude, te mandarei um presentinho nesta semana!

     E da mesma forma que apareceu, sumiu. Clarice ficou estarrecida por alguns minutos, sem ação. E a curiosidade se apoderou de seus pensamentos. Aquela semana ia demorar para passar...



#Continua.








terça-feira, 11 de setembro de 2012

#16 Uma visita à casa da tia Alden


     Naqueles dias, D. Maria reencontrou uma prima que não via há muito tempo. Quando crianças, elas eram muito amigas e se trocaram cartas até a adolescência, porém, uma se mudou e perdeu o endereço da outra e não se falaram mais.
     Por acaso, encontraram-se no mercado, e o papo foi dos grandes. Temendo pelo horário, as duas trocaram contatos e D. Maria ficou na obrigação de visitar Alden. Disse à prima que levaria sua filha Clarice para conhecê-la. E foi o que fez.
     Na semana seguinte, lá estavam as duas à frente daquele enorme casarão em estilo inglês, um pouco afastado da cidade, bem conservado quando comparado a sua idade. Tocou-se a campainha. O que se pode ouvir foram passos lentos, que se dirigiam à porta. Alden, sorridente, fez as honras da casa e as convidou para entrar. Clarice, logo de cara, ficou fascinada com aquele lugar que nunca tinha visto, mas que parecia ser muito familiar. Estranho.
     Depois de horas de conversas, risadas, lembranças, Alden, agora muito mais à vontade com as duas, começou a contar sobre suas experiências com livros não divulgados em larga escala.
     Levou-as até a biblioteca e mostrou alguns exemplares exclusivos. Os olhos de Clarice brilharam quando viu O Livro, igualzinho ao seu. Aí foi uma chuva de perguntas, que Alden procurou responder da melhor forma possível. Por ser mais experiente do que Maria (embora Maria tenha explicado para a menina, meio por cima), Alden explicou as facetas pormenorizadas de todas as coisas para Clarice; falou sobre tudo: história, integrantes, poderes...  disse também que só os integrantes da Ordem possuiam aquele livro. Destacou que os homens que a haviam seguido aquela vez no mosteiro eram da Charna, uma irmandade totalmente oposta à Lumiére, e que estão em guerra permanente desde os primórdios da humanidade. Entretanto, os Charna nunca obtiveram nenhuma vitória efetiva. Por isso da raiva excessiva. 
     Clarice, com aquele ar de "agora tudo faz sentido" ficou pensativa; precisava digerir todas aquelas informações. E sabia que visitaria mais frequentemente a casa da "tia" Alden.




#Continua.


      

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

#15 Realidade ou Ficção?


.     A vida de Clarice estava abalada, seu psicológico não colaborava. Exames médicos haviam constatado que a adolescente - ela estava com 15 anos - tinha uma disfunção rara em seu coração e o nome soava meio estranho: Pericardicite aguda; uma rara condição em que a membrana cardíaca chamada pericárdio (a membrana mais externa do coração) inflama quando da ocorrência de uma deficiência do sistema imunológico, ou seja, Clarice sofreria ataques toda vez que sua imunidade estivesse baixa, quando as defesas do organismo estivessem fracas.
.      Naqueles primeiros dias o balde de água fria: Nada de jogar futebol. Se jogasse, estaria correndo risco de vida. Clarice se perguntava, em meio a lágrimas, o porquê daquilo estar acontecendo com ela: "Tanta gente ruim no mundo que não presta pra nada e eu aqui, sofrendo de algo que me inutilizará pelo resto da vida!? Isso não é justo!!!" Lembrou-se do seu antigo protetor, Emanuel, o velhinho. Chamou-o em seus pensamentos, esperou algumas horas e nada. Ele nunca havia demorado tanto para respondê-la. Ficou um pouco mais deprimida, estava se sentindo só. Já eram altas horas da noite e ela não conseguia dormir, imersa em seus pensamentos... Mas enfim adormeceu; E sonhou.

***

.     Clarice estava em uma sala ampla, cor de ouro, e à sua frente estendia-se uma enorme mesa com um banquete de todo o tipo de comida imaginável: pães, legumes, carnes de várias espécies, bebidas, doces, salgados... Haviam muitas pessoas, Clarice calculava em torno de mil. Era estranho o ambiente pois parecia se tratar de alguma época remota, analisando-se pelos trajes ou o estilo de arquitetura. Sentia-se um pouco excluída, é verdade, mas ninguém parecia notar sua presença naquele lugar. Então ela puxou uma banqueta que estava próxima a uma das paredes e se sentou, observando. Bruscamente um homem, aparentando ser o anfitrião e estar um pouco alterado pela bebida, mandou trazer algo, que Clarice não pode ouvir. Surgiram mulheres vestidas sensualmente e com muitas jóias, trazendo utensílios de ouro e prata: Copos, talheres, adagas. O homem ordenou que fossem servidos alimentos e vinho nos objetos, e tudo discorrendo numa fanfarra absurda. De repente, dedos de mão de homem surgiram no ar, e escreviam junto à parede. E mudou o semblante do anfitrião e seus joelhos batiam um no outro. Clarice quase entrou em êxtase, tentando saber quem escrevia aquilo. E a mão escreveu algo que não se podia ler, só olhar para aquilo causavam dores nos olhos e na cabeça. Todo mundo no salão ficou apavorado, alguns corriam para qualquer lado, outros desmaiavam. Clarice não entendeu o motivo; e então foi que conseguiu visualizar o que estava escrito: MENE MENE TEQUEL PARSIM.
.     Não entendeu o significado, chegou a pensar se aquelas palavras pertenciam à sua língua de origem. E despertou.

***

.     Ficou ainda algum tempo pensando sobre aquilo, afinal, era muito estranho. Não tinha a menor ideia do que significavam aquelas palavras, mais tarde iria pesquisar.



#Continua

sábado, 19 de novembro de 2011

#14 O jogo


.     Clarice, desde pequena, cultivava uma enorme paixão por esportes, disso todos nós sabemos. Depois dos últimos acontecimentos, estava de certo um pouco assustada, mas com a ajuda de seus pais e os irmãos da Ordem, ela não se sentia mais tão vulnerável quanto antes.
.     Passou a frequentar novamente os treinos de futsal e sua paixão pelo esporte só aumentava a cada dia. Treinava feito uma condenada, tinha sede de conquistar medalhas, ficava no olho do sol quase todo o dia treinando os passes, chutes, movimentação, resistência... Queria estar perfeita, não só para auxiliar o time, mas por um questão interna também, queria sentir que podia fazer algo tão bom ou melhor do que os outros.
.     Chegado o dia da competição entre escolas, Clarice não escondia o nervosismo, bastou que a professora lhe desse uma bola para dar uns chutes e a ansiedade passou. Enfim o primeiro jogo do dia, tudo estava apenas começando.
.     O árbitro apita o início do jogo, tensão à flor da pele. O time de Clarice sai com a bola, e troca passes rapidamente, estava entrosado, prometia grandes vitórias. Até que a bola sobra para Clarice, que num giro brusco recebe-a e chuta, no ângulo, mas logo em seguida vai ao chão, desacordada. As colegas de equipe vibram com o gol precoce e se desesperam ao vê-la estirada. A professora corre, verifica a pulsação e ainda está respirando, pede para que se afastem. A tensão aumenta ainda mais. Um pouco alterada, a professora põe o ouvido junto ao peito de Clarice, e nota que os batimentos estão descompassados. A ambulância está demorando e ela mesma decide levar a menina às pressas para o hospital. As meninas do time tem de voltar ao jogo e prometem fazê-lo por Clarice.
.     Chegando lá, só se vê médicos e enfermeiros correndo e arrumando tudo. O cardiologista de plantão é acionado por um enfermeiro quando este, avisado pela professora dos batimentos da menina, checa e constata que é muito possível ser arritmia. O médico realiza os procedimentos cabíveis e estabiliza a frequência cardíaca; Providencia uma maca na sala de observação para Clarice. Depois de alguns momentos de desespero Clarice acorda, chama pela mãe que está ao seu lado:
-Mãe, eu to bem.
-Graças à Deus, estava muito preocupada contigo menina!
-O que aconteceu?
-Os médicos acham que você teve um princípio de enfarto... Mas fica tranquila que já passou.
-E como as meninas foram no jogo?
A professora interfere:
-Elas ganharam, e dedicaram a vitória a você.





#Continua

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

#13 Na velha biblioteca


.     Clarice depois de ter passado por aquela situação totalmente anormal, teve um sono muito profundo, só acordou no outro dia, que por sorte era feriado, e levantou da cama quando já eram passadas as 11 horas da manhã. Olhou ao redor, algo parecia diferente, mas lembrou que tinha muito o que conversar com sua mãe.
.     A primeira coisa que fez foi relatar todo o acontecido à  Maria, que ficou radiante, pois finalmente Clarice estava tomando o rumo para a qual nasceu. Clarice fez todas as perguntas que lhe vieram à mente e ficou bem estarrecida com algumas revelações de Maria.
.     Depois do almoço - afinal ela não ia tomar o café da manhã, já estava tarde -, pegou o último livro que acabara de ganhar, que pertencia aquela coleção tão fantástica que a fazia sonhar e resolveu lê-lo sentando recostada sobre a cabeceira de sua cama. Uma brisa suave vinha da janela, que estava entreaberta, e balançava de leve seus cabelos escorridos sobre os ombros.
.     Sentiu novamente aquela paz; "Como isso é maravilhoso!" Clarice pensou. Como o ruído de uma torneira mal fechada, a garota ouviu um "ploc" e voltou-se para a direção da qual vinha o ruído: a escrivaninha. Encima do livro negro, que tinha recebido do velhinho quando era criança, viu uma pequena folha de cor parda, um pouco amassada, fixada com um alfinete. Num sobressalto se dirigiu até a escrivaninha e leu o bilhete, que igual ao outro, estava em letra de forma, estilo medieval e escrita à mão:

"Na velha biblioteca do Mosteiro São Bento, perto da tua escola, tem um livro antigo de capa marrom. Ele tem umas inscrições em dourado e as folhas amareladas pelo tempo. É a última cópia que existe no país e nele estão as informações que tu buscas. Quando o veres saberás qual é. E tome muito cuidado, porque tem pessoas te seguindo e vão tentar tomar o livro de ti."

.     Aquilo era mais do que uma ordem, era uma curiosidade avassaladora. "O que será que está escrito naquele livro?" Não perdeu tempo, e sem avisar ninguém saiu desvairada pela rua, para tentar retirar o livro na velha biblioteca do mosteiro, onde costumava passar as tardes quando criança.
.     Falou de relance com o frade que era responsável pelo lugar e conseguiu autorização e então foi até a biblioteca e começou a procurar. Não era uma tarefa fácil já que existiam mais de 60 mil exemplares em todo o recinto. Mas lá no fim do segundo corredor Clarice teve seus olhos transformados em cor de ouro; eles refletiam o brilho um pouco apagado do velho livro. Correu e pegou o livro. Mas, de uma hora para a outra, viu que dois homens vestidos de preto entravam no lugar e tinham uma atitude muito esquisita. Aquela  voz soou audível em seus ouvidos: "Esconde o livro dentro do casaco e pega um outro parecido para despistar, que o que aqueles homens querem é o livro!"; Clarice imediatamente colocou sobre a face o capuz do casaco e saiu pelo fundo da biblioteca, pois conhecia um "caminho de fuga" inativado que os frades não usavam mais. Os homens de longe a viram saindo e correram atrás. Clarice foi esperta e atravessou o bosque do fundo do mosteiro e despistou os homens, que gritavam desesperados pelo livro.
.     Ao chegar em casa, foi de imediato ao seu quarto e escondeu o livro, no teto. Quando saiu lá fora para ver se os homens tinham conseguido segui-la, teve um choque: Seu cachorrinho Policarpo estava morto, provavelmente envenenado com algo que estava em sua água, já que esta estava azul. "Talvez Cobalto, intoxicou o pobre Po!" E então viu afixada na parte superior da casinha do cachorro o recado:

"Queremos o livro. Se não nos der, iremos matar todos os seus animaizinhos queridos e todos aqueles que você ama."

.     Clarice quase voou para dentro de casa para relatar os fatos aos pais; a guerra havia começado.





#Continua;